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domingo, 18 de setembro de 2011

PAULO FREIRE,A PARÁBOLA DOS VINHATEIROS E A EDUCAÇÃO DOS JOVENS.


   

Paulo Freire faria 90 anos neste 19 de setembro de 2011. O nobre recifense diferenciou-se das correntes de “esquerda”  defendendo o diálogo com as pessoas mais humildes e colocando sempre a ênfase do seu trabalho na prática concreta e não apenas no discurso. Paulo Freire desenvolveu um método inovador de alfabetização de forma que no nordeste,em 1963, ensinou 300 adultos (cortadores de cana) a ler e a escrever em 45 dias. Aproximou-se do Movimento “Teologia da Libertação” e através dos trabalhos de alfabetização , influenciou de certa maneira as Comunidades Eclesiais de Base. Foi professor, diretor de diversos departamentos em Universidades e outros instituições assim como secretário de Educação na Prefeitura de Luiza Erundina em 1988. Além de pensador renomado, Paulo Freire influenciou a chamada Pedagogia Crítica onde o educando seguiria e construiria seu próprio rumo no  aprendizado. Faleceu em maio de 1997 na capital paulista. Freire foi um grande líder que influenciou e influencia os abnegados “operários da educação” como se fosse o proprietário de uma grande vinha tal qual a relatada numa parábola do Novo Testamento.
       Na parábola dos vinhateiros no Livro de São Mateus, é narrado que um pai de família sai ao romper da manhã para contratar operários para a sua vinha. “Ajustou com eles um denário por dia e enviou-os para o trabalho. Cerca da terceira hora, saiu ainda e viu alguns que estavam na praça sem fazer nada. Disse-lhes ele: - Ide também vós para minha vinha e vos darei o justo salário. Eles foram. À sexta hora saiu de novo e igualmente pela nona hora, e fez o mesmo. Finalmente, pela undécima hora, encontrou ainda outros na praça e perguntou-lhes: - Por que estais todo o dia sem fazer nada? Eles responderam: - É porque ninguém nos contratou. Disse-lhes ele, então: - Ide vós também para minha vinha. Ao cair da tarde, o senhor da vinha disse a seu feitor: - Chama os operários e paga-lhes, começando pelos últimos até os primeiros. Vieram aqueles da undécima hora e receberam cada qual um denário. Chegando por sua vez os primeiros, julgavam que haviam de receber mais. Mas só receberam cada qual um denário. Ao receberem, murmuravam contra o pai de família, dizendo: - Os últimos só trabalharam uma hora... e deste-lhes tanto como a nós, que suportamos o peso do dia e do calor. O senhor, porém, observou a um deles: - Meu amigo, não te faço injustiça. Não contrataste comigo um denário? Toma o que é teu e vai-te. Eu quero dar a este último tanto quanto a ti. Toma o que é teu e vai-te. Eu quero dar a este último tanto quanto a ti. Ou não me é permitido fazer dos meus bens o que me apraz? Porventura vês com maus olhos que eu seja bom? Assim, pois, os últimos serão os primeiros e os primeiros serão os últimos. Muitos serão os chamados, mas poucos os escolhidos.”

       Na última semana , o Ministro Fernando Haddad explicou o baixo rendimento das escolas públicas e afirmou que os baixos índices da Escola Pública estão mais associados a fatores econômicos que `a qualidade das escolas públicas. É como se uvas de tamanho diminuto e insatisfatório assim o fossem por causa da qualidade do terreno e não por imperícia e incompetência do operário. Sendo assim, não seria verdade que o desenvolvimento econômico aliado às modificações demográficas positivas  seriam fatores muito mais decisivos no progresso educacional brasileiro do que simplesmente o investimento em educação não direcionado? O problema da Escola Pública seria, portanto, um problema mais de “clientela” que de formação docente? Deste modo, não seria papel fundamental do processo educativo melhorar essa clientela de forma que ela aprendesse os códigos da elite de modo que pudesse se libertar das amarras sociais alcançando um novo patamar na sociedade? Não seria então mais importante “ cuidar do solo, da oferta de nutrientes” para conseqüentemente “melhorar a vinha” e deixar os trabalhadores mais satisfeitos produzindo uvas melhores e recebendo melhor recompensa do fruto do seu trabalho?
       Sendo assim, qual é a escola que queremos? Uma escola voltada para o trabalho? Para a cidadania? Uma escola que aos dizeres de Freire seria “ bancária, tecnicista e alienante” ou uma escola “libertadora”?A figura do Professor poderia tomar o lugar do dono da vinha que sai e vai ao encontro dos trabalhadores, que no ambiente escolar, seriam os alunos.O fruto da vinha é o aprendizado.
        O dono da vinha oferece a todos a oportunidade de trabalhar em sua lavoura.No final, a todos é dado o mesmo pagamento, afinal de contas, os trabalhadores da hora primeira deveriam se sentir orgulhosos por terem a oportunidade de estarem trabalhando na vinha desde o início e por serem grandes contribuintes na tarefa de produzir bons frutos. É como na parábola do Filho Pródigo : o filho que permaneceu com o pai não entendeu que a maior recompensa que ele pode ter tido é o fato de ter permanecido ao lado do seu pai  participando do seu trabalho. Deste modo, devemos considerar que não basta a atenção aos primeiros. É necessário preocupar-se com os últimos. Há espaço para todos; e isso não é um mero doutrinamento “socialista” mas tão somente uma estratégia de sobrevivência pacífica e harmoniosa em sociedade antes que a massa rebelada se volte contra a elite perplexa.
Tais exemplos e  ensinamentos são importantes para os dias de hoje nos quais discutimos qual é o currículo que queremos e qual a escola que buscamos. Será que todos os alunos e professores estão preparados para a conclusão de que a dádiva maior é ser ativo integrante do processo educativo?Será que nós, como professores cientes de nossas obrigações, temos consciência do perfil do aluno que temos  e de qual é o nosso papel no processo educativo de cada um deles com as suas particularidades e diferenças? Será que não exageramos quando às vezes norteamos nosso trabalho nos vestibulares e ENEMs da vida com a falsa concepção de que o mais importante é  que todos poderiam ser engenheiros ou médicos? O que realmente deveríamos fazer para oferecer uma vida melhor aos jovens?
       Noventa anos depois de ter surgido, Paulo Freire se mostra tão atual quanto na década de 60 com o seu exemplo de administrador  da vinha, que nos convida a todos a pensar sobre nossas práticas e a sermos prestativos e compreensivos com aqueles que vêm depois de nós.
JT


sábado, 10 de setembro de 2011

Roque Santeiro e o Berço do Herói


Na quarta feira, 07 de setembro, fiquei deitado assistindo programas gravados no canal a cabo VIVA que é um canal de TV por assinatura brasileiro, que faz parte do grupo Globosat. Passava um capítulo da novela Roque Santeiro  que foi apresentada pela Rede globo em TV aberta em 1985,baseada em um trabalho original de Dias Gomes, a peça de teatro O Berço do Herói.
Na peça, um cabo do exército brasileiro na Campanha da Itália em plena Segunda Guerra Mundial sai correndo em direção ao exército inimigo e é tido como morto findada a batalha. Como seu corpo nunca fora encontrado, é tido como herói de guerra, à partir disso tudo , em sua cidade natal começa a tomar forma um grande sistema de comércio turístico explorando a história do herói morto, passando a cidade inclusive a se chamar “Cabo Jorge”. Quase todos os órgãos, clubes e entidades da cidade passam a se chamar “Cabo Jorge”. Eis que 20 anos depois, o fujão aparece na cidade e se encontra com o prefeito, que é seu amigo de infância. O herói conta que “sofrera um ataque de pavor, saindo correndo aos gritos com o fuzil em mãos e sem olhar pra nada; havia muita fumaça e névoa, passou por cadáveres de alguns alemães, só então percebendo que havia corrido em direção às linhas inimigas, ouvindo cada vez mais distantes seus companheiros gritando atrás de si, passou por escombros, mais adiante continuando a correr sem saber por que ou conseguir parar viu-se dentro de uma floresta onde se perdeu. Fazia frio, final de outono europeu, quase inverno, tempo encoberto. Após passar por maus bocados durante o dia e vagar um tempo que ele não sabe especificar, durante o qual os sons de batalha foram ficando cada vez mais distantes, ele avistou uma casinha, viu luz, aproximou-se cautelosamente, observou sorrateiramente pela janela uma bela mulher, que estava sozinha. Ele resolveu bater, ela atendeu e o deixou entrar para se aquecer, lá passou a noite, um dia, dois, foi ficando, foram se entendendo, o tempo passou, a guerra acabou e ele decidiu continuar vivendo ali com ela. Conforme o tempo passava, algumas pessoas iam chegando enquanto outras iam voltando às casas que tinham abandonado durante a guerra; com ninguém se lembrando ou mesmo se importando em como ele havia chegado ali, se tornara assim parte do lugar e aceito por todos.”[1]       Na peça, o prefeito e outras pessoas que lucravam com a história, decidem se livrar do visitante inoportuno e o acabam envenenando.
       A novela Roque Santeiro teve a peça como base, sendo o Cabo Jorge substituído por um coroinha com extrema habilidade em confeccionar estátuas de santos e que acabaria morrendo ao enfrentar as tropas de um criminoso, o bandido Navalhada. Dessa forma, Luiz Roque Duarte, conhecido como Roque Santeiro passa a figurar como santo até que retorna à cidade 17 anos depois. O enredo da novela gira em torno da presença do ilustre forasteiro que muita ente não conhece.
       Na última cena que assisti, Sinhozinho Malta entra preocupado no quarto de Viúva Porcina , que está de camisola, sem muita parte do corpo à mostra e falando dormindo pedindo para alguém se retirar. Sinhozinho a acorda e pergunta com quem ela tava falando, desconfiado de que estivesse sonhando com Roque (que está hospedado na casa de Porcina). Sinhozinho, sobressaltado, então tranca a porta do quarto e diz que vai mandar colocar um monte de trancas. Vai até o quarto de Roque que está deitado sem camisa , com um livro sobe o corpo com  título “O intrépido Garanhão”. Sinhozinho tira a chave do lado de dentro da porta, coloca do lado externo , sai do quarto, fecha a porta e a tranca pelo lado de fora. Sinhozinho então coloca o Chapéu e suspira aliviado.
       A peça[2] é uma crítica à forma como nossos heróis são criados, e escrita na década de 60, em pleno regime militar, seria censurada na década de 70 , mesmo sendo modificada em conteúdo e no título para “Roque Santeiro”, podendo ser exibida somente em 1985 no Governo Civil de José Sarney depois do fim da Ditadura Militar.
       Não se fazem mais novelas como antigamente.
       J.T. Basilisco.

[1] http://pt.wikipedia.org/wiki/O_Ber%C3%A7o_do_Her%C3%B3i
[2] Em PDF , eis a peça: http://pt.scribd.com/doc/17872583/Dias-Gomes-Roque-Santeiro-ou-O-Berco-do-Heroi-pdfrev